Atravesso a rua de olhos fechados,
Ensaiando o impacto do ônibus.
— Colisão frontal ou crânio sob as rodas?
Não me importo com a aparência do cadáver.
A carne quente e pálida apodrecerá fria e suja.
Essas dúvidas surgem da covardia.
Hesitar e adiar é meu canivete suíço.
Percebo agora que só fecho os olhos em travessas e ruelas.
Apenas encaro as avenidas quando tudo está deserto.
O covarde precisa acreditar na própria farsa.
Atravessei a rua e todos os olhos eram ódio.
Meu corpo gordo era o calor que fugia do asfalto.
Cada esquina o cobrador me gritava: — “covardia!”.
[o sentido da vida é aquele percorrido pela linha metropolitana]